REPETIÇÃO DE INDÉBITO TRIBUTÁRIO POR EMPRESA DO LUCRO PRESUMIDO E INCIDENCIA DE IRPJ, CSLL, PIS E COFINS. INVIABILIDADE.

Deveras controvertido é o tema pertinente à tributação incidente sobre as receitas decorrentes da recuperação de tributos feita pelas empresas Brasileiras, com posicionamentos da Receita Federal variando em vários aspectos.

Em nome da objetividade delimitamos o presente estudo às Empresas que adotam o regime tributário do LUCRO PRESUMIDO, visto que esta forma de apuração tributária possui características próprias que possibilitam claramente o afastamento da tributação das receitas decorrentes de tributos recuperados, já que os mesmos não foram deduzidos como despesas anteriormente, e mais, são valores que, em algum momento no passado, já passaram pela linha de receita e já foram tributados.

Impende esclarecer, desde logo, que os tributos recuperados se dividem em duas partes, o PRINCIPAL e os JUROS. Ambos serão tratados separadamente, uma vez que são, tecnicamente, receitas da pessoa jurídica de naturezas distintas.

Quanto ao tributo PRINCIPAL recuperado pelas pessoas jurídicas enquadradas no regime tributário do LUCRO PRESUMIDO, temos o quanto disposto expressamente no Artigo 53 da Lei n. 9.430/96:

Art. 53. Os valores recuperados, correspondentes a custos e despesas, inclusive com perdas no recebimento de créditos, deverão ser adicionados ao lucro presumido ou arbitrado para determinação do imposto de renda, salvo se o contribuinte comprovar não os ter deduzido em período anterior no qual tenha se submetido ao regime de tributação com base no lucro real ou que se refiram a período no qual tenha se submetido ao regime de tributação com base no lucro presumido ou arbitrado. (grifos nossos)

A interpretação pura da lei já nos permite inferir que o Tributo Recuperado somente seria tributário no caso das Empresas do Lucro Presumido se, e somente se, no período ao qual se refere a competência da recuperação a empresa fosse LUCRO REAL e houvesse deduzido tais valores como despesa à época.

Para empresa que sempre foi lucro presumido não há qualquer discussão, a lei expressamente não exige a tributação do PRINCIPAL.

A lei contempla também a hipótese de a Empresa comprovar que o tributo se refere a período ao qual a mesma adotara o regime do Lucro Presumido e, portanto, mesmo que na atualidade fosse lucro presumido ou lucro real não haveria tributação sobre os valores recuperados.

Essa interpretação da norma contempla uma lógica adotada pela Receita Federal em todas as suas manifestações sobre o assunto, qual seja, a de que o tributo recuperado somente será tributado como receita caso tenha sido utilizado como despesa dedutível em algum momento do passado.

É o que se observa no Ato Declaratório Interpretativo SRF nº 25, de 24 de dezembro de 2003: “Art. 1º. Os valores restituídos a título de tributo pago indevidamente serão tributados pelo Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ) e pela Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), se, em períodos anteriores, tiverem sido computados como despesas dedutíveis do lucro real e da base de cálculo da CSLL.”(grifos nossos)

No mesmo sentido, Solução de Consulta nº 651 – Cosit de 27 de dezembro de 2017:

ASSUNTO: Imposto sobre a Renda de Pessoa Jurídica – IRPJ. EMENTA: BASE DE CÁLCULO. RECUPERAÇÃO DE TRIBUTO PAGO INDEVIDAMENTE. Os valores restituídos a título de tributo pago indevidamente somente serão tributados pelo IRPJ se, em períodos anteriores, tiverem sido computados como despesas dedutíveis do lucro real, seja qual for o fundamento para a repetição do indébito. DISPOSITIVOS LEGAIS: Lei nº 9.430, de 1996, art.53; ADI SRF nº 25, de 2003. ASSUNTO: Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL

EMENTA: BASE DE CÁLCULO. RECUPERAÇÃO DE TRIBUTO PAGO INDEVIDAMENTE. A recuperação de valores pagos indevidamente a título de tributo somente serão tributados pela CSLL se anteriormente foram computados como despesas dedutíveis da base tributável da CSLL, seja qual for o fundamento para a repetição do indébito. DISPOSITIVOS LEGAIS: Lei nº 9.430, de 1996, art.53; ADI SRF nº 25, de 2003. (grifos nossos)

Como se nota, absolutamente insustentável a cobrança de IRPJ ou CSLL sobre as receitas decorrentes de Tributos Recuperados pelas pessoas jurídicas tributadas pelo LUCRO PRESUMIDO, desde que, à época do pagamento do mesmo tributo a empresa não o tenha utilizado como despesa dedutível para IRPJ e/ou para CSLL.

No que tange ao PIS/COFINS sobre os valores do PRINCIPAL, referente aos tributos restituídos pela Pessoa Jurídica optante do LUCRO PRESUMIDO também não há incidência. É o que se observa no Ato Declaratório Interpretativo SRF nº 25, de 24 de dezembro de 2003: “Art. 2º Não há incidência da Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (Cofins) e da Contribuição para o PIS/Pasep sobre os valores recuperados a título de tributo pago indevidamente.”(grifos nossos)

No que tange à tributação dos JUROS incidentes sobre os tributos recuperados pelas Empresas a questão é um pouco mais complexa.

A posição da Receita Federal é no sentido de que se trata de receita nova e, como tal, deve pagar: Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ); Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (Cofins) e Contribuição para o PIS/Pasep. Com a devida vênia, não parece a interpretação mais coerente do Sistema Tributário Nacional.

Quanto ao IRPJ e a CSLL, o Tema foi tratado à exaustão no Recurso Extraordinário (RE) 1063187, com repercussão geral reconhecida (Tema 962), onde a União questionava decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) que havia afastado a incidência do IRPJ e da CSLL sobre a taxa Selic recebida por uma fundição (Eléctro Aço Altona S/A) sediada em Blumenau (SC) na repetição de indébito tributário, onde compareceu, também, como Amicus Curiae a CONFEDERAÇÃO NACIONAL DO COMÉRCIO DE BENS, SERVIÇOS E TURISMO – CNC.

Deste julgamento extraiu-se a seguinte tese que vigora hoje em regime de Repercussão Geral, em todo Brasil, vinculando órgãos judiciais e administrativos: Tese: É inconstitucional a incidência do IRPJ e da CSLL sobre os valores atinentes à taxa Selic recebidos em razão de repetição de indébito tributário.

O colegiado, acompanhando o voto do relator, ministro Dias Toffoli, considerou o IR e a CSLL podem incidir sobre valores relativos a lucros cessantes (que substituem o acréscimo patrimonial que deixou de ser auferido em razão de um ilícito), mas não sobre danos emergentes, que não acrescentam patrimônio. No entendimento do colegiado os juros de mora legais servem para recompor o patrimônio do Credor que precisou se socorrer de outros créditos para suportar a ausência do crédito retido indevidamente pelo fisco.

Houve modulação dos efeitos desta decisão, já no âmbito dos Embargos de Declaração ao julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 1063187, onde ficou claro que: “[…] a decisão embargada se aplica apenas nas hipóteses em que há o acréscimo de juros moratórios mediante a taxa Selic em questão na repetição de indébito tributário (inclusive na realizada por meio de compensação), seja na esfera administrativa, seja na esfera judicial. 3. Modulação dos efeitos da decisão embargada, estabelecendo-se que ela produza efeitos ex nunc a partir de 30/9/21 (data da publicação da ata de julgamento do mérito), ficando ressalvados: a) as ações ajuizadas até 17/9/21 (data do início do julgamento do mérito); b) os fatos geradores anteriores à 30/9/21 em relação aos quais não tenha havido o pagamento do IRPJ ou da CSLL a que se refere a tese de repercussão geral. 4. Embargos de declaração parcialmente acolhidos.” (grifos nossos)

Nesse quadro, resta evidente a não incidência de IRPJ e CSLL sobre a repetição de indébito tributário para as Empresas que, mesmo tendo fatos geradores anteriores a Setembro de 2021, não recolheram os mencionados tributos decorrentes da tese firmada pelo Tribunal.

Mas o assunto não se esgota, há que se discutir a incidência do PIS/COFINS, sobre os JUROS decorrentes da Repetição de Indébito Tributário. Ao que parece, a melhor interpretação da norma é considerar indevida também esta incidência.

O conceito de FATURAMENTO, para fins de incidência destas contribuições PIS/COFINS, de acordo com o entendimento dado pelo Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário 574.706/PR, COM REPERCUSSÃO GERAL, aduz que: “… O conceito de faturamento diz com riqueza própria, quantia que tem ingresso nos cofres de quem procede à venda de mercadorias ou à prestação dos serviços, implicando, por isso mesmo o envolvimento de noções próprias ao que se entende como receita bruta. (Grifei)” Ministro Marco Aurélio.

Nessa mesma linha e no mesmo julgamento seguiram a maioria dos Ministros, a lembrar-se do voto do Ministro Cezar Peluso, cuja clareza merece transcrição também: “O problema todo é que, neste caso, se trata de uma técnica de arrecadação em que, por isso mesmo, se destaca o valor do ICMS para efeito de controle da transferência para o patrimônio público, sem que isso se incorpore ao patrimônio do contribuinte. (…) trata-se de um trânsito puramente contábil, significando que isso, de modo algum, compõe o produto do exercício das atividades correspondentes aos objetivos sociais da empresa, que é o conceito de faturamento (…)” (grifei)

A doutrina também segue na mesma linha, a começar por Antônio Carlos Minatel[1], segundo o qual: “(…) nem todo ingresso tem natureza de receita, sendo imprescindível para qualificá-lo o caráter de ‘definitividade’ da quantia ingressada, o que não acontece com valores só transitados pelo patrimônio da pessoa jurídica, pois são por ela recebidos sob condição (…)” E mais, prossegue o eminente jurista aduzindo que a definitividade a que faz referência consiste em que o “(…) ingresso definitivo é aquele que adentra o patrimônio do vendedor em contrapartida da mercadoria transferida ao comprador (…”). Ao final arremata: “Portanto, só se pode falar em ‘receita’ diante de ingresso a título definitivo no patrimônio da pessoa jurídica (…)”

Sem maiores delongas, resta evidente que os Juros Selic, na repetição de indébito tributário, dada sua natureza de recomposição dos danos patrimoniais do Contribuinte, não se mostra condizente com novo ingresse definitivo, menos ainda com nova disponibilidade própria. Este valor veio para recompor uma parda, simples assim.

  • Nesse sentido é que já existem registros de Decisão Judicial que, adotando a mesma lógica do Supremo Tribunal Federal adotou para afastar o IRPJ e CSLL nas repetições de indébito tributário, também considera indevida a contribuição de PIS/COFINS nestas mesmas repetições sob o seguinte argumento: “[…] O mesmo entendimento se aplica em relação à incidência das contribuições ao PIS e à COFINS, na medida em que a recomposição de danos emergentes desborda do conceito e dos limites do faturamento e da receita bruta. Posto isso, DEFIRO a liminar pleiteada, para suspender a exigibilidade de incidência de PIS e COFINS sobre a taxa Selic, ou taxa equivalente (limitada à Selic), nos indébitos tributários.” (MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL (120) Nº 5003039-72.2022.4.03.6128 / 2ª Vara Federal de Jundiaí.     Juiz: JOSE EDUARDO DE ALMEIDA LEONEL FERREIRA – 18/07/2022)

Dante do exposto, resta absolutamente inviável a incidência e a cobrança de IRPJ, CSLL, PIS e COFINS sobre os valores havidos pela PESSOA JURÍDICA tributada pelo LUCRO PRESUMIDO a título de REPETIÇÃO DE INDÉBITO TRIBUTÁRIO, de quaisquer tributos, seja por meio de ressarcimento em dinheiro ou por compensação, conforme melhor inteligência das normas constantes no Sistema Tributário Brasileiro.

[1] “Conteúdo do Conceito de Receita e Regime Jurídico para sua Tributação”, p. 100/102, item n. 4, 2005, MP Editora;

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